Tecnologias Digitais em escolas indígenas
Por: Guilherme S.
18 de Agosto de 2022

Tecnologias Digitais em escolas indígenas

O uso da sala de aula Invertida a partir das TDs

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Tecnologias Digitais em escolas indígenas: O uso da sala de Aula Invertida a partir das TDs

 

 

Danielle de Farias Tavares Ferreira[1]

Guilherme Arthur Lino da Silva[2]

 

1 INTRODUÇÃO

As políticas de Estado direcionadas à educação brasileira investem, desde a década de 1990, em implantação das Tecnologias Digitais (TD). Essas tecnologias têm se disseminado via implantação de laboratórios de informática nas instituições de ensino e através da distribuição de equipamentos para estudantes e professores, tais como: notebook, tablet, modem, dentre outros. (SILVA, 2014).

Esses avanços tecnológicos vivenciados no Brasil refletem o cenário de globalização pós-moderna atual ao passo que revolucionaram e ainda permanecem em constantes mutações influenciando os modos de como as pessoas se relacionam nas grandes cidades e também nas regiões mais longínquas. Silva (2014)  considerou em sua pesquisa que o campo educacional brasileiro não tem acompanhado os avanços das tecnologias digitais na mesma velocidade que estas são criadas.

As escolas brasileiras ainda não estão preparadas para acolher as pessoas e inseri-las culturalmente nas linguagens digitais. Essa realidade se replica nas escolas indígenas brasileiras. Moran (2000) também nos afirma que as mudanças ocorrem lentamente nas escolas sob pressão das tecnologias que a cultura digital agrega ao se expandir. No entanto, de forma muito rápida utilizamos as tecnologias digitais no nosso cotidiano. É fato ainda que atualmente passássemos rapidamente do livro para a televisão, o celular, o computador. Ao mesmo tempo em que temos essas trocas rápidas entre meios tecnológicos deixamos, muitas vezes, de trazer e de incorporar essas novas linguagens digitais na educação escolar ou mesmo resistindo à utilização de metodologias mais contextualizadas com essa evolução.

Desse modo, tem tornado ainda mais difícil a contribuição das tecnologias digitais no âmbito educacional quando não se há políticas educacionais direcionadas para a expansão de seu uso e para a conscientização da cultura digital na formação dos cidadãos de hoje. Silva (2014) confirma essas dificuldades de expandir as TDs em decorrência da existência de alguns desafios como: formação docente, utilização de novas metodologias de ensino, tempo pedagógico e estrutura das instalações físicas.

Dentro desse cenário desafiador e em constante luta pela expansão das TDs na educação brasileira, pontuamos que seja fundamental destacarmos a importância de analisar como essas tecnologias digitais atreladas às metodologias em sala de aula, a exemplo da sala de aula invertida têm se integrado no dia-a-dia de indígenas de uma escola de assentamento indígena situada no município de Águas Belas-PE, local onde foi realizada a aplicação da metodologia ativa da sala de aula invertida através da disciplina de Estágio Supervisionado do curso de Licenciatura em Química.

Diversos trabalhos e pesquisas como a pesquisa de Costa (2010) vêm ressaltando os modos das tecnologias digitais, atreladas às metodologias ativas de ensino,  estarem chegando no cotidiano indígena e estabelecendo novas relações de sociabilidade. De certo, não se pode negar a participação do índio e da população Guaraní, mais especificamente, nesse universo digital.

“Eles estão sendo inseridos nessa nova perspectiva tecnológica e construindo uma nova roupagem às suas comunidades (…) índios no mundo digital”. Desde 1987 vem sendo realizado o projeto denominado Vídeo nas Aldeias, na área de produção audiovisual indígena no Brasil, com o objetivo de apoiar as lutas dos povos indígenas para fortalecer suas identidades e seus patrimônios territoriais e culturais, por meio de recursos audiovisuais. (COSTA, 2010, p. 10).

A comunidade Guaraní, por exemplo, é a maior do Brasil e se disponibiliza de uma ferramenta virtual bastante significativa para o seu povo chamado Tekoa Virtual. Essa ferramenta se assemelha a uma rede social com intenções pedagógicas, onde se promove divulgação de artigo até publicação de fotos semelhante ao Instagram. “A produção audiovisual dos índios Guaraní foi bastante incrementada pelo projeto Vídeo nas Aldeias, financiado pelo Ministério da Cultura. Há inclusive editais do MinC (Ministério da Cultura) com o objetivo de financiar estas produções” (MONARCHA, 2014, p.71).

As comunidades indígenas, quando se aproximam dos centros urbanos, geralmente, se apropriam de meios tecnológicos. Costa (2010) afirma que a criança indígena no contato com as tecnologias se depara com costumes diferentes dos suas informações e culturas ocidentais, podendo progressivamente perder sua identidade cultural. Nesse contexto, as comunidades indígenas, por estarem próximas aos centros urbanos e convivendo simultaneamente com a sociedade envolvente, principalmente no ambiente escolar, rompe as fronteiras culturais inserindo nas comunidades indígenas e nos processos de aprendizagem formal essa nova ordem de comunicação, instrumentalizadas pelas Tecnologias Digitais. (FEITOSA, 2017 p.01).

Contudo, Hall (2004) assegura que no período da modernidade não existe uma identidade pura. Predomina-se um hibridismo das culturas originado pela migração dos povos, o que promove uma descentralização do sujeito e de sua identidade movida por encontros e desencontros com a cultura digital. Diante dessas considerações, torna-se imprescindível o relato de experiência do uso das tecnologias digitais a partir da utilização de uma metodologia ativa de ensino dentro de uma escola predominantemente indígena.

 

2 METODOLOGIA

A metodologia escolhida é construída de forma qualitativa, contínua e de cunho social por abordar o que seja perceptível nas relações sociais. Utilizaremos a modalidade de estudo de caso intrínseco que, de acordo com Gil (2010), é aquela em que o caso constitui o próprio objeto da pesquisa. O que o pesquisador almeja é conhecê-lo em profundidade. Nessa direção, a presente pesquisa possui um cunho qualitativo e terá como campo empírico a escola em que ocorreu a atividade de estágio supervisionado.

O percurso metodológico será dividido em etapas. A priori, realizaremos um levantamento bibliográfico sobre a temática das tecnologias digitais atreladas ao desenvolvimento de metodologias ativas de ensino, dando um recorte para a técnica da sala de aula invertida. Para isso, utilizaremos alguns bancos de dados brasileiros tais como: Portal CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e SciELO (Scientific Electronic Library Online) como base para levantamento de referenciais teóricos. Após essa etapa, adentramos na descrição da aula desenvolvida durante o estágio do referido estudante de Licenciatura.

A etapa seguinte é a entrada em campo, que consiste em se intermediar por um membro significativo para aquele grupo como, por exemplo: líderes, gerentes, organização empresarial, cacique ou pajé em relação a aldeia indígena (GIL, 2010). A outra etapa é a coleta de dados que consiste em se fundamentar em observação e entrevista. A observação nesta pesquisa é direta e participante, consiste em obter informação com a realidade do grupo, e tem como pré- requisito a presença constante do pesquisador (GIL, 2010), demandando um contato constante com o campo. A entrevista pode ser evidenciada de diferentes formas como: estruturada, semiestruturada e informal. As estruturadas e semiestruturadas são pesquisas mais úteis em etapas mais avançadas para saber o dado referente a um tópico específico, como por exemplo, comparar a qualificação e experiências dos funcionários de uma determinada empresa. Já, segundo Gil (2010), a entrevista informal é a mais relevante para essa pesquisa porque é tida pelas conversas casuais e tem os mesmos instrumentos e relevância que a pesquisa estruturada, embora não explícita.

Gil (2010) afirma ainda que o pesquisador utiliza esses instrumentos de entrevista para descobrir as categorias, bem como comparar essas percepções. Essa pesquisa tende a obter grande quantidade de informação oriundas de diferentes fontes e com isso o pesquisador precisará construir frases curtas, trabalhar com abreviaturas, evitar perda de detalhes, podendo ser recomendado a construção de um banco de dados, como já nos é previsto.

Nossa pesquisa de campo se constituirá das seguintes etapas: Leitura do material, busca de “categorias locais de significação” que consiste na categorização dos significados da referida metodologia aplicada no olhar do grupo que está acontecendo a pesquisa. Por fim, não descartaremos o ato de nos fundamentamos também em se aproximar dos meios tecnológicos em que a comunidade está inserida (MORAN, 2000) propondo alternativas para a desmistificação de que a tecnologia no âmbito educacional não contribui para a formação, se opondo ao paradigma conservador.

 

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A partir do desenvolvimento desta temática, que relaciona a cultura indígena às tecnologias digitais, houve o aprofundamento do conceito sobre a cultura digital e como os indígenas têm feito uso das tecnologias digitais nessa integração com seus costumes. Diante disso, verificamos os modos e as percepções dos indígenas na integração com as tecnologias digitais e com a proposta de uma sala de aula diferente em seu cotidiano.

Nos anseios de alcançar os objetivos de maneira mais abrangente e analisando a cultura digital na educação indígena, a partir do estudo de sua aplicabilidade durante uma aula que se utilizasse da técnica de sala de aula invertida. Os objetivos específicos foram traçados a partir do objetivo geral e consolidaram o percurso da referida pesquisa de campo quando buscamos identificar, através da observação e conversas informais, registrar como os indígenas se utilizavam das Tecnologias Digitais no cotidiano. Salientamos que esta disciplina foi paga pelo referido estudante no ano de 2019 e trouxe aqui o relato de parte do relatório feito por ele.

 

            3.1 ATIVIDADES DESENVOLVIDAS

✔ Estudo individualizado com elaboração de fichamentos dos referenciais levantados sobre TDs e metodologias de ensino ativo utilizados pelos docentes da escola comunitária indígena;

✔ Estudos dos procedimentos teórico-metodológicos a serem desenvolvidos;

✔ Registros de observação em campo aplicando questionário aos docentes e discentes para levantamento das TDs e realizando uma aula interativa e com base na metodologia da sala de aula invertida, a qual ocorreu na escola comunitária indígena em destaque.

✔ Descrição da atividade de Sala de Invertida Aplicada em uma turma de ensino fundamental II da referida escola.

 

3.2 PASSO-A-PASSO DA METODOLOGIA APLICADA

A metodologia da sala de aula invertida propõe que o estudante seja o foco do planejamento e que seu contexto, sua identidade e demais marcadores passem a ser considerados pelos docentes durante a elaboração desse tipo de proposta de sala.

A proposta utilizada na escola indígena abarcou as seguintes etapas, conforme figura 1 Abaixo que encontra-se o link de acesso a imagem:

Figura 1- Painel com o planejamento da metodologia utilizada pelo professor. 

https://www.bing.com/images/search?view=detailV2&insightstoken=bcid_rC7h0I1HUYsE-2LPblnpFto0O04M.....y4*ccid_LuHQjUdR&form=ANCMS1&iss=SBIUPLOADGET&selectedindex=0&id=-9326621&ccid=LuHQjUdR&exph=423&expw=600&vt=2&sim=10

Observamos que dentro da escola citada havia um laboratório de informática em que a referida aula pôde ter este recurso disponibilizado aos estudantes antes e durante o encontro com o docente estagiário.

Os estudantes puderam jogar através de simuladores como a Roleta de Química e o Espace Lab de Química, ambos disponíveis gratuitamente na internet. Foi possível perceber também que de início a aplicação da sala de aula invertida causou certa estranheza por partes dos educandos, pois o costume com a sala de aula tradicional fez com que muitos pensassem que o momento antes do encontro com o docente-estagiário não fosse considerado como momento a compor a referida aula.

Outro fato interessante discorreu sobre a empolgação da maioria dos estudantes em serem ambientados com o laboratório de informática e estarem diante dos computadores, fazendo uso dessas máquinas, ainda pouco utilizadas na referida escola ( por falta de acesso a internet também, que em alguns dia cai e fica sem sinal). A escola, de fato, é localizada em terreno íngreme e de difícil acesso às redes e até a elétrica é fácil de faltar muitas vezes.

Ainda segundo o relato de experiência da aula proposta, durante o encontro com o docente-estagiário, os estudantes já se mostravam bastantes seguros do tema a ser discutido na aula e bem familiarizados com os simuladores indicados para uso antes do encontro.

Facilmente formaram grupos e escolheram os objetos de dentro da sala que iriam discorrer na ficha de composição química. Os estudantes conseguiram concluir as fichas de composição ainda durante o encontro e depois da aula ficaram de realizar o mesmo procedimento em suas comunidades e com outros objetos ou mesmo com ervas medicinais bastante utilizadas em seus territórios.

A experiência formativa de dar uma aula interativa em uma escola indígena foi bastante positiva para o estudante- estagiário, que nessa época residia próxima à comunidade e cursava seu curso de Licenciatura a distância. Foi possível desmistificar muitos estereótipos que consideram ser o território indígena um ambiente inerte, obsoleto e ultrapassado, distante dos avanços atuais das tecnologias digitais, discurso esse que só intensifica a exclusão de povos tradicionais da presente cultura digital indispensável de ser acessada aos que dela necessite. 

Na realidade, o que as populações indígenas esperam são as criações de políticas públicas que possam favorecer o acesso à internet nestes territórios longínquos até porque a inclusão digital é inserção social e não descaracterização das raízes e tradições, como alguns discursos liberais pregam quando o assunto é levar internet às populações indígenas e quilombolas.

Desse modo, a referida aula, baseada numa metodologia ativa e totalmente vinculada aos recursos tecnológicos e às práticas de uma cultura digital foi agradavelmente desenvolvida na turma de nono ano do ensino fundamental e bastante elogiada por eles, que autonomamente foram redescobrindo o universo www e dos jogos interativos de gamificação.

 

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A experiência possibilitou discorrer sobre os benefícios de se ampliar as possibilidades de uso das Tecnologias Digitais na educação indígena. Esse estudo de caso resultou numa análise do uso das TDs a partir da utilização de uma metodologia ativa com a proposta de sala de aula invertida, a qual foi enriquecedora tanto para a formação dos discentes quanto do professor em formação.

 Os resultados encontrados, a partir deste relato de experiência, levaram-nos às reflexões que nos permitiram trazê-los a desenvolver publicações e espaços de socialização das experiências exitosas colhidas e com o foco na discussão das possíveis contribuições, possibilidades e desafios de se integrar as TDs no contexto social e cultural da educação indígena.

Por fim, também esperamos realizar aprofundamentos, através de pesquisas futuras junto ao IFPE e aos seus docentes sobre o uso dessas metodologias, atreladas às TDs durante o período de pandemia, ao passo que nos possibilitará vislumbrar o cenário atual de inserção da produção docente nesta trajetória de ensino, a qual se consolidou inesperadamente e de forma cada dia mais crescente na educação brasileira e, consequentemente, indígena.

 

  1. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COSTA, Alda Cristina. A comunidade indígena e o mundo tecnológico: reflexões sobre os impactos das mídias sociais na vida dos Aikewára. Simpósio Hipertexto e Tecnologias na Educação, Anais. Pernambuco: UFP, p. 1-14, 2010.

FEITOSA,  Leni  Barbosa.  As TIC’s e a Educação Escolar Indígena: Possibilidades e Desafios. Humanidades & Inovação, v. 4, n. 4, 2017.

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa, 5. ed. São Paulo, Atlas. 2010.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. CONJECTURA: filosofia e educação, v. 19, n. 2, p. 199-203, 2014.

MORAN, José Manuel. Novas tecnologias e mediação pedagógica. Papirus Editora, 2000.

MONARCHA, Hellen. Redes Sociais e Sociedades Indígenas: entre dígitos e jenipapo. Novas Edições Acadêmicas, 2014.

SILVA, Maristela Maria Andrade. Formação continuada de professores e tecnologia: concepções docentes, possibilidades e desafios do uso das tecnologias digitais na educação básica. 2014. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Pernambuco.

 

 

 

[1]Técnica em Assuntos Educacionais do IFPE-Campus Ipojuca; E-mail: danielleferreira@ipojuca.ifpe.edu.br

 

 

[2]Professor de Química; E-mail:<guilhermearthurlino@gmail.com>

 

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